quinta-feira, 30 de abril de 2009

Um olhar sobre Portugal e o Tratado do Atlântico Norte

They [The Parties of the Treaty] are determined to safeguard the freedom, common heritage and civilisation of their peoples, founded on the principles of democracy, individual liberty and the rule of law. They seek to promote stability and well-being in the North Atlantic area.
In Preâmbulo do Tratado do Atlântico Norte

A História não está relacionada com os factos, mas sim com diversos contextos. É nesses mesmos contextos, partes peculiares de um dado momento, que a História é delineada, de modo a preservar os interesses momentâneos. Há sempre que atentar à interrogação e análise de duas perguntas de extrema relevância: «Porquê?» e «Para quê?».
É certo que os contextos se alteram. É certo que a História leva o seu curso natural e muda por transformações intrínsecas ao próprio Sistema Internacional. Aí há que repensar o presente, olhando para o futuro. 
A NATO surgiu há precisamente 60 anos e, por força do fim do Bipolarismo, viu-se obrigada a renovar os votos para uma nova Era. Surgiu num âmbito, renovou-se para outro, mantendo a preponderância no comando do Atlântico Norte e nas mais diversas questões de segurança. Aqui entra Portugal entre os fundadores do Pacto do Atlântico.
O envolvimento de Portugal na NATO tem em si um contexto paradoxal. O Estado Novo ia contra os princípios de democracia e de liberdade individual defendidos pelos restantes fundadores. Porém, realçava algo mais apetecível que a legitimação do regime Salazarista, a importância geoestratégica do arquipélago dos Açores, como confirmada aquando a II Guerra Mundial, de modo a garantir a estabilidade Ocidental. 
Todavia, a “crescente” ameaça comunista para Ocidente despoletou a “queda” do Governo Português na esfera de influência norte-americana, através da presença na importante organização de defesa militar. Portugal criou, assim, noutros tempos, uma tradição atlanticista a desenvolver nos anos vindouros e um entrosamento com os restantes membros do Atlântico Norte.
E agora, volvidos 35 anos após a Revolução dos Cravos, a relação estabelecida entre Portugal e a NATO toma proporções importantes ao nível da Política Externa, uma vez que a estratégia nacional não pode diferir da política da Organização, assegurando a plena coordenação de espaços de acção e de objectivos a concretizar. A regulação sem estandardização genérica, ou seja, um modo operacional de funcionamento, reflecte o Interesse Nacional do Estado. E para o caso português é importante que esta delineação passe pela Organização do Tratado do Atlântico Norte. 
A NATO está, deste modo, ligada à postura atlanticista neste século XXI, devido à organização estratégica que pode contribuir para um melhor planeamento da política de segurança na ordem internacional. É com base neste conjunto de objectivos e na redefinição dos propósitos iniciais que a Aliança Atlântica se tem tornado num mecanismo viável de política internacional.
A História demonstra que as decisões tomadas têm efeitos e consequências na vida de outrem, ou seja, as deliberações tomadas num dado contexto histórico têm resultados concretos. Aconteceu com a NATO e com o seu poder de delineamento de objectivos e de entrosamento com as políticas externas dos Estados membros. Daí que o atlanticismo português seja tanto um modo de compenetração nos limites estipulados, como de guia-exemplo para a cooperação.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

SIMOTAN IV - Convite

A Comissão Portuguesa do Atlântico e o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade Técnica de Lisboa (UTL) têm o imenso prazer em convidá-los a participar na SIMOTAN IV, uma simulação do Conselho do Atlântico Norte que terá lugar em Lisboa (no ISCSP) de 21 a 23 de Maio.

Pedimos a todos os candidatos que nos enviem a candidatura e os restantes documentos até dia 10 de Maio. Para obter a ficha de candidatura e o convite mais detalhado por favor contactar para secretariadoajpa@gmail.com.

Aguardamos o vosso contacto,

Os melhores cumprimentos,

terça-feira, 28 de abril de 2009

NATO e UE que futuro?

(Imagend daqui e daqui)


A NATO, conta hoje com 28 membros, desses 28 membros, 23 são Estados-membros da UE. Pelo que se levanta a questão: poderão a NATO e a UE coexistir no futuro?
Apenas se tiverem objectivos e razões de ser concorrentes. O que não é obrigatoriamente o caso, ora, sendo a UE cada vez mais uma união além de económica, política, logo, brevemente, militar também. O mais sensato seria que agisse na cena internacional de forma muito semelhante à de um Estado.
Estou ciente que neste momento coexistem perfeitamente. E que apesar de comunicarem pouco. A UE e a NATO não têm tido grandes conflitos de interesse tendo mesmo cooperado bem no passado, em zonas como os Balcãs, por exemplo. Também sei que a política internacional se rege pela medida do possível e não do desejável, a construção europeia sendo exemplo paradigmático disso mesmo.
Todavia, creio ser agora - momento em que se começa a pensar e a preparar o novo conceito estratégico da NATO - o momento indicado para se irem formulando estas hipóteses meramente académicas.
Continuando a hipótese académica, a meu ver e creio ser a tendência racional, faria muito mais sentido que em vez de serem os Estados individuais a integrarem a NATO, se passasse a pasta para a UE. Assim, a UE, passaria a ser dotada de uma força de defesa comunitária, estruturada e com uma cadeia de comando própria. Satisfazendo as necessidades europeias e por sua vez resolver em parte as reclamações financeiras da Organização, assegurando a eliminação do risco de colidir ou de trabalhar paralelamente à NATO.
Apesar de tudo, estamos ainda longe de reunir uma tal vontade política pois ela resultaria numa maior perda de soberania e de visibilidade que os Estados-membros tanto apreciam.

A OTAN no Século XXI

Neste pequeno artigo pretende-se abordar dois temas que, pela sua actualidade, são de extrema importância para reconhecer que, de facto, estamos perante uma mudança no paradigma de actuação da Organização do Tratado Atlântico Norte, que de organização de defesa colectiva cada vez mais assume o papel de organização de cariz securitário, apostando na segurança, ao invés dessa outra vertente mais defensiva.

Para demonstrar esta tendência, os dois assuntos que pretendo trazer ao debate dizem respeito, em primeiro lugar, à actuação da Nato no combate à pirataria e em segundo lugar, relativo à actividade cada vez mais diversificada da ISAF, International Security Assistance Force, no Afeganistão.

Naquilo que concerne à primeira, na sexta-feira passada, dia 24 de Abril, a NATO confirmou a continuação das suas actividades no combate à pirataria, com grande destaque para o Standing NATO Maritime Group 1 (SNMG1), que actualmente se encontra no Golfo de Aden e em águas do Corno de África.

Considerando o grande aumento dos ataques piratas, o contributo da NATO afigura-se preponderante, tendo-se por isso decidido cancelar as visitas a Singapura e Australia, fazendo com que as fragatas do SNMG1, tenham maior flexibilidade para regressar ao campo de operações e por aí ficarem, pelo menos até dia 28 de Junho.

Neste sentido, as fragatas da OTAN, através da sua presença activa, contribuirão para o incrementar da segurança das rotas comerciais e navegação internacional nesta região, assumindo uma grande visibilidade através da condução de tarefas de vigilância providenciando protecção para deter e suprimir os ataques armados.

Esta realidade tem assumido tamanha importância que, na última Cimeira de Estrasburgo, os Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros da Organização, elaboraram um Comunicado, no dia 4 de Abril, onde afirmavam que “We are considering options for a possible long-term NATO role to combat piracy, including by taking into account, as appropriate, regional requests for maritime capacity-building”. Podemos assim constatar que, de facto, existe um reconhecimento desta ameaça ao mais alto nível, considerando-se que, efectivamente, e apesar de estar longe dos seus objectivos iniciais, cada vez mais a OTAN funcionará como elemento fundamental na estabilização de regiões mais complexas.

O outro tópico acima mencionado, diz respeito ao papel desempenhado pelo International Security Assistance Force em Kabul, no Afeganistão, neste caso específico, com tarefas relacionadas com o apoio na área da saúde, nomeadamente através da sua actuação no Regimental Aid Post na região de Sangin, a norte da província de Helmand. É uma actividade que conta não só com o contributo da Aliança Atlântica, mas também, e talvez isto seja o mais importante, com uma articulação entre as forças afegãs e elementos civis. Este posto de ajuda, é coordenado por uma equipa de quarto Médicos de Combate e um Médico Oficial, e têm conseguido salvar centenas de civis, sempre como é óbvio, com o apoio das autoridades locais.

Para estas funções, um corpo de Royal Marines do Comando 45, asseguram a segurança actuando estreitamente com a Forward Operating Base (FOB) Jackson, localizada no Centro do Distrito de Sangin e ainda em articulação com pequenas bases de patrolhamento. As suas patrulhas diárias têm, progressivamente contribuindo para a reconstrução, desenvolvimento e legitimação da “governance” local.

Através da análise breve destas duas iniciativas podemos, então, retirar uma conclusão relativa à consideração no ínicio lançada. Cada vez mais vemos a OTAN em diferentes cenários, em diferentes territórios, porém, antes de se criticar ou pôr em causa a sua continuidade, deve-se ponderar quais os propósitos que levam uma organização inicialmente confinada ao hemisfério norte e ao relacionamento euro-americano, a intervir em tais cenários.

Na base de tudo isto, consta uma progressiva incapacidade da parte dos Estados em dar resposta á grande diversidade de desafios emergentes de um mundo cada vez mais interdependente e como tal mais complexo, nomeadamente naquilo que diz respeito ao relacionamento que mantém entre si. Isto ainda mais se agrava em Estados cuja realidade política é extremamente instável, onde os preceitos democráticos, apesar de amplamente enaltecidos, se traduzem em pouco mais do que meras palavras. É principalmente aqui que a OTAN tem um papel fundamental. Não se pretende, de todo, interferir nas esferas locais e nas suas hierarquias, que, de certa forma, mais ou menos criticável, asseguram a normalidade dessas sociedades. Aquilo que se pretende, resulta principalmente num apoio, num ajuda ao nível da construção, e em muitos casos, reconstrução das sociedades, visando essencialmente um ambiente político mais estável, em tudo necessário para pôr em funcionamento todas as outras estruturas da sociedade, trabalhando em conjunto com os membros locais. É um papel de estabilizador, de garante da segurança dessas regiões, contribuindo assim para uma sociedade mais organizada e segura, onde os seus cidadãos possam viver em tranquilidade, usufruindo da ampla rede de direitos e obrigações a que têm direito.

domingo, 26 de abril de 2009

Na rota da cooperação: a primeira visita oficial ao Tajiquistão

Foi entre os dias 20 e 22 de Abril de 2009 que decorreu a primeira visita oficial da Assembleia Parlamentar (AP) da NATO ao Tajiquistão, pela delegação do Comité da Dimensão Civil de Segurança, liderada pelo vice-presidente, Vitalino Canas, e pelo Secretário Geral da AP da NATO, David Hobbs. Este encontro incluiu ainda os mais altos representantes do país, nomeadamente o Presidente do Tajiquistão Rahmon, o Ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) Hamrokhon Zafiri, embaixadores e organizações internacionais, que se traduziu essencialmente na cooperação estabelecida entre a NATO e o Tajiquistão, bem como a sua importância estratégica enquanto país vizinho do Afeganistão.

Ora, antes de mais convém referir que o Tajiquistão é um dos países mais pobres da Ásia Central, cuja guerra civil (1992-1997) destruiu uma economia já de si débil. Apesar de possuir fortes recursos naturais (gás, urânio, ouro e prata), a sua indústria hidroeléctrica, alimentar e do alumínio são pouco desenvolvidas e a sua principal produção de algodão tem sido fortemente afectada com a descida dos preços da matéria-prima. E, para além do mais, a situação agrava-se com a inclusão do território tajique na rota afegã na proliferação do terrorismo e do tráfico de droga.

E por isso, tem-se assistido a uma procura permanente da NATO em fomentar as relações com o Tajiquistão, na medida em que têm evoluído os esforços na cooperação com todos os países que procuram a estabilidade no Afeganistão.

De facto, esta foi uma das problemáticas mais discutidas nesta visita, nomeadamente a importância do Tajiquistão na ajuda à estabilização e reconstrução do país vizinho. De acordo com o MNE Zafiri, "a segurança e a estabilidade da Ásia Central depende fundamentalmente da situação no Afeganistão" e por isso o Tajiquistão tem desenvolvido iniciativas conjuntas no âmbito do treino e formação de militares e do controlo de fronteiras.

Além disso, o tráfico de droga foi outro assunto desenvolvido, visto permanecer um dos maiores problemas naquela região, e especificamente no Tajiquistão que partilha cerca de 1400 km de fronteira com o Afeganistão, de ondem vem grande parte da produção. O presidente Rahmon defende a importância estratégica do Tajiquistão, na medida em que se poderia tornar numa zona tampão e impedir o alastramento do tráfico de drogas e do terrorismo.

O que eu creio ser importante nesta visita da delegação a um país como o Tajiquistão é efectivamente a adaptação estratégica da organização no combate ao terrorismo, na proliferação da segurança e estabilidade na missão com o Afeganistão. A aposta em cooperar com outros países em prol da missão, tem facilitado não só o sucesso da missão em si, como também à integração e desenvolvimentos dos países intervenientes. Não só no Tajiquistão, como no Uzbaquistão e no Paquistão, onde são permitidas uma rota alternativa para a circulação de tropas e mantimentos no Afeganistão. Assistimos ao aumento da esfera de influência da NATO no sentido da cooperação e segurança alargados a outros países com semelhantes objectivos, cujo seu precurso deve ser seguido, ao mesmo tempo que a sua importância estratégica parece aumentar.

Mais pormenores acerca da visita do comité ao Tajiquistão: NATO Parliamentary Assembly

domingo, 5 de abril de 2009

Entrevista ao vice-almirante Alexandre Reis Rodrigues (Secretário-geral da CPA)

Via Diário de Notícias:

A NATO celebra amanhã 60 anos. Com reformas em curso, como perspectiva a evolução da Aliança?
Sendo a primeira vez [na Cimeira de Estrasburgo/Kehl] que a nova Administração americana vai lidar com os líderes europeus, não se vai avançar com nada de importante. Para saber o que vai ser no futuro, temos que esperar pelo menos mais um ano.

O novo Conceito Estratégico (CE) é um dos pontos da agenda da cimeira que começa hoje...
O grande desafio é o de decidir que modelo de relacionamento vai estabelecer com a UE, em termos de Segurança e Defesa. O CE diz que a Identidade Europeia de Segurança e Defesa se desenvolve dentro da NATO, o que foi aceite há 10 anos e de forma pacífica. Mas a UE não é a mesma de 1999. Como é que a NATO e a UE se vão entender? Julgo que os europeus não podem deixar de falar na sua Política de Segurança e Defesa e não vejo como a NATO pode desenvolver um CE novo sem consultar a UE.

Foi comandante operacional da NATO. O alargamento enfraquece a Aliança, no plano militar?
A dimensão e importância dos alargamentos têm sido de natureza política. Se continuar por esse caminho, mais difícil será gerir consensos e sensibilidades, que nalguns casos são até irreconciliáveis.

A NATO deve policiar o mundo?
A NATO ainda não resolveu a contradição de dizer que não quer ser o polícia do mundo e, na prática, actuar como se o fosse. Tem aproveitado as crises e situações de instabilidade para os assumir como seus, como foram os casos da crise energética na Ucrânia ou os ataques cibernéticos à Estónia. Mas isso são mais questões para a UE [no primeiro caso] ou de âmbito nacional, que não têm nada de militar.

A França reentra oficialmente na NATO. Isso dará origem a novas clivagens com os EUA?
Estão a admitir um membro que foi crítico da Aliança, e dos EUA, nos últimos 40 anos. É uma reviravolta e isso é positivo. A preocupação é sobre o futuro: ao dar à França o Comando da Transformação [em Norfolk], isso vai dar voz aos europeus sobre a forma como as operações podem ser conduzidas. E não sei como isso se vai harmonizar com o outro comando estratégico [operacional, liderado pelos EUA e sediado na Bélgica], que está sintonizado para outras doutrinas e ideias. Pode deixar de haver alinhamento com quem manda no terreno...